quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Artigos | Cooperativa funciona?
 
Quem estuda a nossa música popular e a vida de seus personagens, sempre se depara com o caso clássico do sujeito (homem ou mulher) que larga a terra natal para tentar a sorte no Rio de Janeiro. Claro, ali ficavam as principais emissoras na Era do Rádio, e os sucessos eram irradiados a partir daquele centro.

São Paulo, em escala mais modesta, foi mais um pólo de música regional – ou caipira – do que dos chamados gêneros nacionais. Usando uma lupa mais forte, conseguimos enxergar mais uns poucos centros regionais que tiveram alguma influência até os anos 60: Recife (com a gravadora Mocambo), Porto Alegre, Salvador... Mesmo assim, gênios como Caymmi, Lupicínio ou Luiz Gonzaga tinham de comprar o bilhete para a velha Capital Federal, se quisessem fazer sucesso nas ondas do rádio.

A chegada da televisão equilibrou o jogo entre Rio e São Paulo, principalmente com os grandes festivais da Record, cujo impacto é marcante até hoje. Mesmo assim, a derrocada da emissora paulista e o crescimento da rede Globo fez com que o sotaque carioca novamente dominasse o país, atraindo novas levas de candidatos ao sucesso.


O modelo começou a se esgotar nos final dos anos 80. A globalização e a padronização das canções começaram a mostrar um oceano “que se atravessa com águas pelas canelas”. No mundo inteiro, certo esgotamento formal das formas consagradas fez com que crescesse o interesse pela música feita fora dos grandes centros, a chamada música étnica, exótica ou alternativa. A evolução das técnicas de gravação, diminuindo custos e facilitando a criação de estúdios menores e até móveis tem um peso nessa história. Novos focos de efervescência musical foram surgindo, aqui e ali.

No Brasil, Pernambuco se tornou influência real com o movimento Mangue Beat. Porto Alegre estruturou uma cena própria, com características bem definidas. Brasília virou uma capital do rock (mas não só). Salvador criou um mercado próprio de produção e consumo, com a indústria do carnaval e as derivações do axé. Belém e São Luiz tem identidade própria, conseguimos distinguir o acento típico do carimbó, das guitarradas e do reggae brasileiro quando sintonizamos alguma rádio local. Belo Horizonte, sob a influência ainda marcante do Clube da Esquina, consegue parir filhos tão diversos quanto Uaki e Sepultura.

Mas a questão econômica ainda pesa muito. Em pleno século XXI, viver distante dos grandes centros continua sendo um desafio para a vida do músico. Organizam festivais regionais, circuitos universitários, programas de rádio, tocam em bares e festas. Colocam seu trabalho na internet, mas a coisa se perde nesse novo “oceano” midiático.

Alguns se organizam em cooperativas, clubes, sindicatos. Um exemplo recente é a Coletânea de Música do Piauí, lançada em agosto de 2011. A Capivara (Cooperativa dos Profissionais da Música do Piauí) reuniu músicos, compositores, intérpretes e produtores num trabalho coletivo de registro fonográfico: Um CD duplo, com 34 faixas e um livreto apresentando os participantes.

Ouvi-los é entrar em contato com um leque de estilos, uns mais regionais, outros mais universais. Tem baião, reggae, xote, balada pop, toada nordestina, samba,bossa, jazz e atétango. Se ainda não é possível enxergar um movimento musical original, fica a certeza de que esteconjunto de bons músicos e intérpretes, que abarca pelo menos duas gerações, está criando um ambiente propício para vôos mais altos. Este fortalecimento da cena musical é fundamental, e a união de forças torna mais viável as formas de produção e veiculação.

Capitaneados pelos músicosDalmir Gomes, presidente da Capivara, e tendo Gilvan Santos como coordenador de produção, os artistas piauienses criaram um Fórum de Música e conseguiramo apoio doSebrae e de entidades estaduais ligadas à cultura. Alguns estados já têm suas associações de músicos, e outros, como a Rede Potiguar de Música, estão em formação. É um caminho que pode render frutos, e serve de inspiração para outras regiões.

Sabemos que artista é um bicho socialmente difícil, com um ego muito sensível. Se não fosse assim, não seria artista! Depois de famoso, tem de cuidar da carreira individual, lidar com a imprensa, os fãs, etc. Mas enquanto não chega a este patamar, é bom contar com os outros, ajudar os próximos, criar parcerias na criação, produção e circulação de obras. A fama é uma montanha muito íngreme, e a chance de chegar ao topo sem parceiros é mínima. Mãos à obra portanto, músicos!

Fonte: revistamusicabrasileira.com.br

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